Dezenas de pessoas manifestaram-se esta quinta-feira em São Tomé exigindo justiça no caso 25 de novembro de 2022, quando quatro homens foram mortos, com sinais de agressão e tortura, no quartel militar, após alegada tentativa de Golpe de Estado.
A manifestação durou cerca de uma hora e culminou na Praça Yon Gato, a poucos metros do gabinete do primeiro-ministro são-tomense, Patrice Trovoada.
“Estado matou meu filho […] nós queremos justiça desses tropas que mataram eles sem necessidade. Fizeram Golpe de Estado falso para matar eles sem necessidade. Queremos justiça”, apelou Elalia da Glória, mãe de Isac, uma das vítimas, na altura com 33 anos, que deixou quatro filhos menores.
Em causa está o ataque ao Quartel do Morro, em São Tomé, na noite de 24 para 25 de novembro de 2022, após o qual três dos quatro assaltantes, civis, que agiram com a cumplicidade de alguns militares, e um outro homem – identificado como o orquestrador do ataque e detido posteriormente pelos militares – foram submetidos a maus-tratos e acabaram por morrer, nas instalações militares.
Maisa Silva, esposa da vítima conhecida por Armando, também se juntou ao protesto, erguendo uma bandeirola com a frase “lugar do criminoso é na cadeia”.
Maisa afirmou que “a vida ficou mais difícil” e que nunca teve qualquer visita ou acompanhamento das instituições do Estado, desde que mataram o seu marido.
“Até hoje, nós estamos atrás de justiça, não temos nada. Ninguém diz nada, ninguém fala nada e nós estamos assim. Armando morreu, deixou três filhos menores. Ninguém apareceu, nada recebemos”, disse.
Laime Cotú, um jovem empreendedor que disse participar pela primeira vez na manifestação, questionou a atuação do Ministério Público e dos Tribunais e lamentou o facto de, passados dois anos, ainda não serem conhecidos “os criminosos que mataram quatro cidadãos no quartel”.
“O Presidente da República tem que tomar medida, tem que tomar decisão. O culpado disso é o Presidente da República”, vincou.
Para o jurista Augério Amado Vaz, “deveria ser mais profícuo uma manifestação junto ao Supremo Tribunal de Justiça”, já que “a maior responsabilidade é dos tribunais”.
Segundo o jurista, o Ministério Público fez o seu trabalho, inclusive recorreu da decisão que remeteu o processo para o Tribunal Militar.
“Eu acho que havia todas as condições para que pudessem proceder ao julgamento ou esclarecer os factos do dia 25 de novembro […]. O tribunal militar é uma fantochada, não tem base legal nenhuma, porque não existe em São Tomé e Príncipe um código penal militar. A acusação foi feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR) civil, portanto este é um artifício que se arranjou para, de facto, não se esclarecer esses casos”, defendeu Augério Andado Vaz.
Após os acontecimentos de 25 de novembro, o Ministério Público são-tomense, com a ajuda da Polícia Judiciária e da PGR de Portugal, promoveu a acusação contra mais de 20 militares, incluindo altas chefias, exigindo que fossem afastados das Forças Armadas, mas, até ao momento, não se realizou o julgamento, cujo processo foi remetido para o Tribunal Militar, que há mais de um ano reclama meios para o seu pleno funcionamento.
Durante a manifestação, apelou-se ao Presidente da República para tornar público um relatório feito por uma missão da Comunidade Económica da África Central (CEEAC) que esteve no país na sequência do acontecimento de 25 de novembro de 2022, e que até ao momento não foi divulgado.
O protesto de hoje seguiu-se a outros realizados no sábado, em Lisboa e em Londres, e à tomada de posição de partidos da oposição, que exigem justiça e esclarecimento pelas mortes ocorridas em 25 de novembro.
Lusa