O Presidente tunisino Kais Said rejeitou hoje “qualquer forma de interferência estrangeira” face às fortes críticas da oposição e da comunidade internacional, que questionam a legitimidade do referendo constitucional realizado em 25 de julho.
Na consulta popular foi aprovada uma nova Constituição, apesar da abstenção recorde de 70 % do eleitorado.
“A Tunísia é um Estado livre, soberano e independente. A sua independência e soberania estão acima de todas as outras considerações”, declarou o Presidente, durante uma reunião com o ministro dos Negócios Estrangeiros, Othman Jerandi, segundo um comunicado de imprensa da Presidência.
O primeiro referendo no país magrebino foi feito em 25 de julho, no qual foi aprovado, com 94% dos votos e uma participação de 30,5% do eleitorado, o texto constitucional, redigido unilateralmente pelo Presidente, que assumiu plenos poderes um ano antes, e que estabelecerá um regime político “ultra presidencialista”.
O secretário de Estado norte-americano Antony Blinken informou na quinta-feira, nas redes sociais, que “apoia fortemente as aspirações democráticas do povo tunisino”.
“Um processo de reforma inclusivo e transparente é crucial para restaurar a confiança de milhões de tunisinos, incluindo aqueles que não participaram no referendo e que se opõem à nova constituição”, acrescentou, Blinken.
A União Europeia instou as autoridades a alcançar um amplo consenso entre as forças nacionais, incluindo os partidos políticos e a sociedade civil, antes das próximas eleições legislativas de dezembro, para “preservar” o processo democrático.
Os resultados preliminares, publicados na terça-feira pela Instância Superior Independente para as Eleições (ISIE), mostraram discrepâncias entre os números fornecidos pelas mesas de voto e os seus centros regionais, com um maior número de votos e mesmo de eleitores registados.
O documento, oficial, foi posteriormente eliminado e suscitou preocupações sobre uma possível fraude.
O prazo oficial para apresentação da contestação aos resultados termina hoje, embora, segundo o Tribunal Administrativo, apenas os partidos registados durante a campanha eleitoral o possam fazer, pelo que a maioria dos partidos políticos, que denunciam a fraude eleitoral, são excluídos, por terem optado por um boicote.
A nova Constituição, que, segundo os especialistas, instaura um regime “ultra presidencialista”, entrará em vigor até 29 de agosto, uma vez concluído o período de recursos, e substituirá a Carta Magna de 2014.
A Tunísia, berço da Primavera Árabe (2010), enfrenta uma crise económica agravada pela pandemia de covid-19, pela guerra na Ucrânia — país de que depende para as suas importações de trigo — e está muito polarizada desde que Saied, democraticamente eleito em 2019, assumiu todos os poderes em 25 de julho de 2021.
O Presidente, que não pode ser destituído, designa o chefe de Governo e os ministros e pode demiti-los como bem entender, além de poder submeter ao parlamento documentos legislativos com caráter de “prioridade”.
Lusa