Os chefes de Estado de Angola e do Ruanda falaram hoje por telefone, na sequência dos esforços de pacificação no leste da República Democrática do Congo (RDCongo), afirmou a Presidência angolana.
Segundo uma nota da Presidência angolana, o contacto entre João Lourenço e Paul Kagame serviu para fazerem “uma avaliação da situação no terreno, principalmente dos compromissos assumidos por cada uma das partes no âmbito da Cimeira de Luanda”.
Os dois chefes de Estado também “apreciaram em conjunto perspectivas para a operacionalização de todos os mecanismos acordados, para que volte a haver paz e segurança na região Leste da RDCongo”, acrecenta a nota de Luanda.
O grupo rebelde Movimento 23 de Março (M23), cujos confrontos com o exército da República Democrática do Congo já provocaram centenas de mortos este ano, manifestou-se hoje “pronto a retirar-se” dos territórios que ocupa e iniciar um diálogo de paz.
O M23 solicitou uma “reunião” com a força militar conjunta da Comunidade da África Oriental (EAC, na sigla em inglês), que começou a ser deslocada para o leste da RDCongo, bem como com o mediador do bloco regional, o ex-presidente queniano Uhuru Kenyatta, que encabeça o processo de paz entre o Governo congolês e os grupos armados ativos nessa parte do país.
O grupo, considerado terrorista por Kinshasa e que prossegue os seus ataques desde o início da primeira ronda de negociações de paz em Nairobi, em abril último, tem-se mantido até agora fora do processo, por imposição do Governo congolês.
O grupo confirmou igualmente aceitar o “cessar-fogo” exigido no passado dia 23 de novembro numa cimeira em Luanda patrocinada pelo Presidente angolano, João Lourenço, mediador da União Africana para o diferendo entre a RDCongo e o Ruanda, que Kinshasa acusa de apoiar o M23.
Embora Kigali negue veementemente este apoio, um relatório de peritos da ONU divulgado em agosto confirmou essa cooperação.
Na cimeira de Luanda, o Presidente congolês, Felix Tshisekedi, e o ministro ruandês dos Negócios Estrangeiros, Vincent Viruta, que representou o Presidente Paul Kagame, apelaram à cessação das hostilidades a partir de 25 de novembro, mas os combates nunca cessaram efetivamente.
Pelo menos 272 pessoas foram mortas num ataque do M23 na semana passada na cidade de Kishishe, no território de Rutshuru, na província do Kivu do Norte, de acordo com o Governo congolês.
Os rebeldes estimam, no entanto, o número de civis mortos em oito, devido a “balas perdidas”.
A M23 foi criada em 2012, quando soldados congoleses se revoltaram devido à perda de poder do seu líder, Bosco Ntaganda, acusado pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) de crimes de guerra; denunciando ainda várias violações do acordo de paz de 23 de Março de 2009, que dá o nome ao movimento.
Entre outras condições, o grupo exige a renegociação do acordo assinado pela guerrilha congolesa Congrès National pour la Défense du Peuple (CNDP) para a sua integração no exército, com forma de melhorar as suas condições.
O CNDP, constituído principalmente por tutsis (grupo que foi a principal vítima do genocídio ruandês de 1994), foi formado em 2006 para – entre outros objetivos – combater os hutus das Forças Democráticas para a Libertação do Ruanda (FDLR), fundado em 2000 por líderes associados ao genocídio e outros ruandeses exilados na RDCongo, para recuperar o poder político no Ruanda.
Após anos de inatividade, o M23 recomeçou os combates em março passado com as Forças Armadas da RDCongo (FARDC), provocando o deslocamento de, pelo menos, 340.000 pessoas no leste do país, de acordo com a ONU.
Após meses de trégua, os combates recomeçaram em outubro e o M23 avançou para o cerco a Goma, capital do Kivu do Norte — a menos de 100 quilómetros da capital do Ruanda, Kigali, no outro lado da fronteira – que os rebeldes tomaram em 2012.
O leste da RDCongo está mergulhado em conflito há mais de duas décadas, alimentado por milícias rebeldes e pelo exército congolês, não obstante a presença da missão de manutenção da paz das Nações Unidas (Monusco).
Lusa