Sábado, 28 de Junho, 2025

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Talibãs adiam novamente anúncio de futuro Governo

Os talibãs adiaram hoje, novamente, o anúncio do seu Governo, cuja composição deverá dar o tom para os próximos anos no Afeganistão, onde o novo regime continua a enfrentar resistência armada na província de Panshir.

Quase três semanas após o retorno ao poder do grupo fundamentalista, tanto a população afegã como a comunidade internacional continuam à espera que seja anunciado quem vai governar em Cabul.

Segundo a agência de notícias francesa AFP, duas fontes dos talibãs afirmaram hoje que o anúncio sobre o futuro Governo não seria feito hoje — apesar de já ter sido adiado de sexta-feira -, decisão que poderá dever-se à situação em Panshir, último reduto de oposição armada ao novo regime.

Há muito tempo conhecido como um bastião anti-talibãs, este vale, sem litoral e de difícil acesso, localizado a cerca de 80 quilómetros a norte da capital, é palco, desde segunda-feira e da saída das últimas tropas norte-americanas do país, de combates entre as forças talibãs e Frente Nacional de Resistência (FNR).

Embora tenham soado tiros em Cabul na noite de sexta-feira para comemorar a vitória dos talibãs sobre Panshir, os talibãs não fizeram nenhum anúncio oficial e um residente de Panshir garantiu à AFP que o rumor era falso.

Ainda assim, o tiroteio provocou dois mortos e mais de 20 feridos, segundo os serviços de emergência da capital, o que levou o porta-voz dos talibãs, Zabihullah Mujahid, a pedir aos seus apoiantes, através da rede social Twitter, que parem de “atirar para o alto” ao “invés de agradecer a Deus”.

Refugiado no Vale do Panshir, o ex-vice-presidente Amrullah Saleh admitiu que a “situação está muito difícil”, numa mensagem de vídeo transmitida na noite de sexta-feira, mas assegurou que “a resistência continua e continuará de pé”.

De acordo com Ahmad Massoud, que lidera a resistência no vale, os talibãs propuseram atribuir à FNR dois assentos no futuro Governo.

Uma oferta feita “enquanto nós pedimos um futuro melhor para o Afeganistão. Nem sequer a considerámos”, garantiu na quarta-feira Ahmad Massoud, filho do comandante Ahmed Shah Massoud, assassinado em 2001 pela Al-Qaeda.

Desde que regressaram ao poder, após uma ofensiva militar-relâmpago que apanhou o Governo e a comunidade internacional de surpresa, os talibãs têm tentado mostrar uma atitude mais moderada, nomeadamente prometendo um Governo “inclusivo” e estabelecendo contactos com personalidades afegãs que se assumem como oposição ao grupo fundamentalista.

No entanto, ainda não foi possível ter certezas sobre as suas verdadeiras intenções ou sobre o lugar que pretendem conceder aos representantes da oposição ou às minorias. A composição do futuro executivo será, portanto, um teste ao desejo real de mudança dos talibãs.

Vários países têm dito e repetiram na sexta-feira que o novo regime será julgado pelas suas ações e não pelas intenções que apregoam.

O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, que estará no Qatar entre segunda e quarta-feira, afirmou esperar que o Governo instituído pelos talibãs seja “verdadeiramente inclusivo”, com “não talibãs” que representem “diferentes comunidades e diferentes interesses no Afeganistão”.

O chefe dos serviços secretos militares do Paquistão, Faiz Hameed, foi visto hoje em Cabul, onde deverá estar para falar com altos responsáveis dos talibãs, com quem Islamabad pretende estreitar laços.https://7144a6289ed8009aaed3c77f07cee7e6.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

Uma das questões mais prementes é a dos direitos das mulheres. A comunidade internacional não esqueceu a brutalidade com que as mulheres foram tratadas durante o primeiro regime dos talibãs (1996-2001), mas os novos senhores do país garantiram que esses direitos serão respeitados.

Apesar disso, admitiram que o futuro Governo não deverá contar com ministras mulheres, devendo a presença feminina recair sobretudo nos cargos inferiores.

Uma perspetiva contra a qual protestaram vários ativistas, numa manifestação realizada na quinta-feira em Herat.

Também hoje, em Cabul, dezenas de mulheres foram para a rua manifestar-se, pelo segundo dia consecutivo, enquanto militantes dos talibãs tentavam dispersar a multidão e impedir que as pessoas no local filmassem a cena com os seus telemóveis, segundo imagens divulgadas nas redes sociais.

Além das questões de segurança, quer as relacionadas com a oposição em Panshir quer com a ameaça do braço local do Estado Islâmico, o novo regime afegão enfrenta outros problemas cujas soluções são urgentes, e o maior de todos é a dificuldade económica.

Assolada por mais de quatro décadas de conflitos, a economia afegã está em frangalhos, privada de ajuda internacional – da qual depende — na sequência da decisão de países como os Estados Unidos ou a Alemanha de congelarem as reservas afegãs e as ajudas ao desenvolvimento.

“O Afeganistão enfrenta um desastre humanitário iminente”, alertou na sexta-feira a ONU, que vai realizar uma reunião entre os Estados-membros a 13 de setembro, em Genebra, para aumentar a ajuda humanitária ao país.

À frente das negociações internacionais com os talibãs, o Qatar indicou, por sua vez, esperar ver “corredores humanitários” abertos nos aeroportos afegãos dentro de 48 horas.

Lusa

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