Os marfinenses votaram neste sábado (31) em eleições presidenciais marcadas por múltiplos incidentes e nas quais o presidente em fim de mandato da Costa do Marfim, Alassane Ouattara, que aspira a um terceiro mandato, fez um apelo à calma.
“Peço aos que lançaram uma palavra de ordem de desobediência civil que levou à morte de homens que a detenham! (…) Digo aos jovens que não se deixem manipular. Trata-se do seu futuro”, afirmou, após votar no liceu Santa Maria, no bairro residencial de Cocody, na capital, Abidjan.
A contagem dos votos já começou e em alguns locais a apuração já havia inclusive terminado. Os níveis de participação serão determinantes para conhecer o impacto do boicote impulsionado pela oposição em eleições cujo resultado será conhecido em cinco dias.
A Costa do Marfim, com 25 milhões de habitantes, é o maior produtor mundial de cacau e se tornou o motor económico da África ocidental francófona, depois de dez anos de forte crescimento.
Assim como na Guiné, onde a reeleição do presidente Alpha Condé para um controverso terceiro mandato causou distúrbios que deixaram cerca de 20 mortos, a oposição marfinense considera que um terceiro mandato é “inconstitucional” e convocou a “desobediência civil”.
“Este golpe de Estado eleitoral foi um fracasso. O povo marfinense conseguiu fazer fracassar estas eleições”, declarou o porta-voz da oposição, Pascal Affi N’Guessan, durante uma conferência de imprensa.
Este dirigente opositor falou de “em 12 mortos” nos incidentes ocorridos durante o dia de votação, uma informação que não pôde ser confirmada por fontes independentes.
Neste contexto de boicote, a participação será crucial. Os postos de votação fecharam as 18h e a comissão eleitoral tem cinco dias para anunciar os resultados.
“Viemos votar no futuro da Costa do Marfim, pelos nossos filhos, para que tenham um trabalho”, afirmou Siaka Coulibaly, dona-de-casa, num posto de votação do bairro popular de Abobo, em Abidjan.
“O processo é tenso e o medo tomou conta da população. Isto pode afetar a participação. Cada um tem sua opinião, mas precisa se expressar. As pessoas não devem morrer por uma eleição”, disse Patrick Allou, de 32 anos, no bairro de Plateau, também em Abidjan.
– Não há eleições “sem tensão” –
Estas eleições geram o medo de uma nova crise na região, abalada pelos ataques jihadistas no Sahel, um golpe de Estado no Mali e protestos políticos na Nigéria.
Desde agosto, cerca de 30 pessoas morreram na Costa do Marfim devido à manifestações que deram origem a confrontos interétnicos.
Trinta e cinco mil membros das forças de ordem foram mobilizados para garantir a segurança do processo de votação.
O presidente da Comissão Eleitoral Independente (CEI), Ibrahime Kuibert-Coulibaly, admitiu que houve “incidentes menores”.
“De um total de 22.381 postos de votação, só ocorreram saques em 30 ou 40. É insignificante”, afirmou o presidente da Comissão, embora não tenha detalhado quantos postos não puderam abrir.
Muitos temem uma crise dez anos depois dos distúrbios pós-eleitorais após as eleições presidenciais de 2010, que deixaram 3.000 mortos. Na ocasião, Laurent Gbagbo (2000-2010) se negava a admitir sua derrota para o atual presidente, Alassane Ouattara.
Ouattara, de 78 anos, reeleito em 2015, decidiu voltar a se candidatar a um novo mandato após a morte repentina de seu afilhado político, o primeiro-ministro Amadou Gon Coulibaly.
A Constituição do país só autoriza dois mandatos, mas a adoção de uma nova Carta Magna, em 2016, zerou o contador, segundo ele. A oposição o questiona.
“Não há período eleitoral sem tensão”, disse em entrevista à AFP Ouattara, que espera vencer no primeiro turno, confiante no bom balanço económico no país.
A oposição, liderada pelo ex-presidente Henri Konan Bédié, não só ataca o presidente em fim de mandato, mas também acusa de parcialidade a Comissão Eleitoral Independente (CEI) e o Conselho Constitucional, considerados “subordinados” e, portanto, incapazes de garantir uma votação justa.
Ouattara e Bédié, antigos adversários na cena política marfinense há três décadas, voltam a se enfrentar em um país onde a média de idade é 19 anos e onde três quartos da população têm menos de 35 anos.