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Num dia tenso, Maputo já se prepara para “sete dias difíceis”

Num movimento de uma manhã atípica, Edgar Chaúque tenta comprar o máximo de alimentos que pode para enfrentar os “sete dias difíceis” que se esperam em Moçambique com a previsão de novas manifestações contra os resultados eleitorais.

 “Com o último anúncio do Venâncio Mondlane, decidimos ir comprar o que falta para que não nos arrependamos nos próximos dias”, explica à Lusa o moçambicano de 46 anos, momentos após comprar alguns produtos num dos principais supermercados de Kachamanculo, nos subúrbios de capital moçambicana.

Num frenesim atípico para uma manhã de quarta-feira em Maputo, como Edgar, dezenas de pessoas têm estado a comprar produtos, com engarrafamento em algumas avenidas, face a uma eventual paralisação, com receio de um cenário semelhante ao dos primeiros três dias de manifestações convocadas por Mondlane em protesto contra alegada fraude nas eleições de 09 de outubro.

 “Está todo o mundo a correr porque não sabemos o que vai acontecer amanhã (…) sete dias é difícil. A parte difícil de tudo isto são as crianças que não poderão ir à escola. Eles estão nas últimas semanas e têm as últimas avaliações, mas todos nós, no fundo, queremos liberdade democrática, sem violência”, declara Cármen João, a escassos metros do seu carro já cheio de produtos alimentares.

Os últimos dias de manifestações convocadas por Mondlane, na semana passada, culminaram com violentos confrontos entre a polícia moçambicana e apoiantes do político em vários pontos do país, com destaque para Maputo, que, à margem das confrontações que ocorreram sobretudo na periferia, esteve quase uma cidade-fantasma, com o comércio paralisado.

Na terça-feira, numa das suas concorridas ‘lives’ vistas por milhares na rede social Facebook, Mondlane apelou para uma greve geral de uma semana a partir de quinta-feira, manifestações nas sedes distritais da Comissão Nacional de Eleições (CNE) e marchas para Maputo em 07 de novembro, contestando os resultados apresentados pela Comissão Nacional de Eleições (CNE), que deram a vitória a Daniel Chapo, apoiado pela Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), no poder, com 70,67% dos votos.

No princípio, Mondlane convocou uma “paralisação geral”, mas, após o assassínio de Elvino Dias, seu advogado, e Paulo Guambe, mandatário do partido Podemos, que o apoia, chamou os seus apoiantes para as ruas, dando-se, assim, início a confrontos entre manifestantes e a polícia em vários pontos do país, com mortos, feridos e detidos, além de lojas fechadas.

Embora na rua as opiniões sobre a contestação aos resultados continuem divididas, para alguns o que está em causa atualmente em Moçambique ultrapassa “ideologias políticas”: trata-se de uma “luta do povo moçambicano”.

“Eu estou pronto para sete dias difíceis, querendo como não, temos de segurar. A Frelimo tem de sair”, diz à Lusa Nelson Rafael Paunde, um jovem lavador de carros na avenida Carlos Morgado, simpatizante assumido de Mondlane.

Não muito longe de Kachamanculo, no mercado de Xipamanene, no bairro do Alto Maé, Carlos Baptista, outro lavador de carros na rua, diz não estar tão pronto como Nelson, embora admita que votou no “VM7 da política moçambicana”, uma alcunha política que lhe foi atribuída pelos seus simpatizantes numa comparação ao português Cristiano Ronaldo (CR7) no futebol.

“Eu votei em Venâncio, mas agora estou a ver que ele está a estragar as coisas  (…) Sete dias? Vamos morrer à fome. Não estou pronto. Eu vivo da rua e ficar sete dias paralisado vai obrigar-me a roubar”, diz à Lusa Carlos Baptista.

Enquanto na rua as opiniões permanecem divididas, a tensão está estampada no rosto da maioria em cada esquina de Maputo, com a indefinição sobre o que vai acontecer nos próximos dias como a única coisa que é consensual: “Independentemente de partidos políticos, isto é uma batalha de todo povo moçambicano”, conclui Edgar Chauque.

Venâncio Mondlane, apoiado pelo Partido Optimista para o Desenvolvimento de Moçambique (Podemos, extraparlamentar), ficou em segundo lugar, com 20,32%, mas afirma não reconhecer estes resultados, que ainda têm de ser validados e proclamados pelo Conselho Constitucional.

A Frelimo reforçou ainda a maioria parlamentar, passando de 184 para 195 deputados (em 250), e elegeu todos os 10 governadores provinciais do país.

Além de Mondlane, o presidente da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo, atual maior partido da oposição), Ossufo Momade, um dos quatro candidatos presidenciais, disse que não reconhece os resultados eleitorais anunciados pela CNE e pediu a anulação da votação.

Na quinta-feira, o candidato presidencial Lutero Simango, apoiado pelo Movimento Democrático de Moçambique (MDM), recusou igualmente os resultados, considerando que foram “forjados na secretaria”, e prometeu uma “ação política e jurídica” para repor a “vontade popular”.

O Centro de Integridade Pública (CIP), uma organização não-governamental moçambicana que monitoriza os processos eleitorais, estima que dez pessoas morreram, dezenas ficaram feridas e cerca de 500 foram detidas, no contexto dos protestos e confrontos durante a greve e manifestações de quinta e sexta-feira, que se sucederam a iguais confrontos violentos em 21 de outubro, também convocados por Mondlane.

Lusa

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