O cantor Paulo Flores diz que há sempre motivos para comemorar a independência de Angola, apesar do que falta alcançar, sublinhando que a sua inspiração, onde se misturam dor e mágoa, continua a ser a bandeira nacional.
O artista angolano, que vive em Portugal há vários anos, vai celebrar 36 anos de carreira com uma digressão que vai passar pela primeira vez por várias províncias angolanas percorrendo Luanda, Benguela, Huambo, Bié, Namibe, Huíla, entre finais de agosto e 12 de outubro.
O cantor, que falou a Lusa em Luanda, à margem da apresentação da digressão, disse que há sempre motivos para celebrar conquistas como a liberdade e a identidade, mesmo que estejam ainda muitas coisas por alcançar, algumas “gritantes e que estão a olho nu”, quando o país prepara as comemorações dos 50 anos de independência (11 de novembro de 1975).
Coisas que preocupam o artista, também ele cinquentenário, e que já as canta “há 36 anos pelo menos”.
Em 36 destes 50 anos de independência, “fui-nos cantando a nós próprios” e isso também é um motivo de celebração: “É por isso que vamos fazer isto (digressão), embora a gente saiba que temos muito ainda por alcançar nessa liberdade conquistada”.
Sobre a reconciliação do país, que viveu em guerra civil praticamente três décadas depois de se tornar independente a 11 de novembro de 1975, considerou que a função dos artistas “é também exercitar o pensamento, e o sentimento, e a capacidade de sentir, e de amar o próximo e respeitar o próximo”.
Destacou, por isso, a importância de continuar a trabalhar “cada um na sua área, para que a reconciliação seja plena e que as pessoas tenham melhores condições de vida e para poder educar os seus”.
Apesar de viver há vários anos em Portugal, Paulo Flores diz que não perdeu as referências angolanas e que estar longe de Angola não significa estar alheado, mas até dar mais valor a essas referências.
“São elas que nos unem e que nos fazem sentir gente muitas vezes no exterior. Na minha casa com as minhas avós, eu desde criança, ouvia músicas em Quimbundo, do Artur Nunes, do David Zé e de outros, daí também a minha angolanidade ser tão presente”, salientou, acrescentando que, quem está fora, por vezes “valoriza mais o funge de domingo do que na Samba ou na Mutamba [bairros de Luanda]”.
O que não significa que não se sinta também português: “Sinto-me português completamente, porque eu tenho língua, tenho poetas, tenho referências, mas a minha a dor, a minha mágoa, a minha inspiração, a minha bandeira é a Angola e isso aí está bem presente também na minha música”.
Não descarta um eventual regresso a Angola, mas diz que nem sempre consegue a paz que deseja em Angola, de onde saiu em 2010.
“Agora volto menos vezes, muitas vezes pelos próprios filhos, pela vida e também por querer uma certa paz, que nem sempre eu consigo, em Luanda, às vezes com tudo que sinto, tão presente, às vezes é preciso essa equidistância para poder compor sem mágoa”.
Uma paz que escapa por sentir tudo o que falta alcançar, “por ver os (…) concidadãos com tanto ainda para alcançar em relação à dignidade, à informação, à educação, às crianças, à segurança, tudo isso que nós queremos que Angola melhore e conquiste”.
Entre os artistas convidados para esta digressão, que se inicia a 31 de agosto na Huíla estão o músico Yuri da Cunha e o ‘rapper’ Prodígio, estando também prevista a entrega de donativos a instituições de caridade que trabalham com crianças, sob a forma de “ferramentas culturais”, incluindo instrumentos musicais, materiais didáticos e de pintura, para estimular o interesse pelas artes e ofícios culturais.
Fonte:Lusa