Mais de 400 mil pessoas “estão em situação de fome” na região etíope de Tigray, devastada pela guerra, anunciou uma autoridade da ONU, pedindo uma ação humanitária urgente para ajudar os milhões de afetados pelo conflito.
A luta entre o governo etíope e a Frente de Libertação do Povo do Tigray (TPLF) ganhou força no mês passado quando os rebeldes lançaram uma grande contra-ofensiva e retomaram a capital regional, Mekele.
Esta semana, duas pontes que permitiam a entrada de ajuda na região foram destruídas, o que provocou denúncias de que o governo etíope tenta interromper a assistência humanitária, algo que negou.
Na sexta-feira, o Conselho de Segurança da ONU realizou sua primeira reunião pública sobre o conflito que já matou milhares e deixou centenas de milhares de pessoas a passar fome.
Ramesh Rajasingham, secretário-geral adjunto para Assuntos Humanitários e coordenador de Emergências e Assistência Humanitária, afirmou, durante a reunião, que a situação “piorou dramaticamente” com o piorar do conflito nas últimas semanas.
“Estimamos que mais de 400 mil pessoas estão em situação de fome e outras 1,8 milhão correm o risco de fome”, disse ele.
“Alguns sugerem que os números são ainda piores, com 33 mil crianças gravemente desnutridas”.
“A vida de muitas dessas pessoas (em Tigray) depende de nossa capacidade de alcançá-las com alimentos, remédios, suprimentos nutricionais e outras formas de assistência humanitária”, acrescentou.
A Etiópia rejeitou as alegações de que tenta cortar a ajuda à região.
– Cessar-fogo, “uma piada” –
O primeiro-ministro Abiy Ahmed, vencedor do Prêmio Nobel da Paz de 2019, enviou tropas a Tigray em novembro para deter e desarmar os líderes da TPLF no poder.
Ele justificou que a medida foi tomada em resposta aos ataques da TPLF aos acampamentos do Exército federal e declarou vitória algumas semanas depois que as forças federais tomaram Mekele.
Mas os rebeldes, que se rebatizaram como Forças de Defesa do Tigray (TDF), recuperaram a capital regional, bem como a maior parte da região. O governo anunciou um cessar-fogo unilateral, que as TDF descartaram como “uma piada”.
A subsecretária-geral para Assuntos Políticos do Conselho de Segurança da ONU, Rosemary DiCarlo, pediu na sexta-feira que o grupo apoiasse o cessar-fogo “imediatamente e totalmente”.
“Um cessar-fogo observado por todas as partes não só facilitaria o fornecimento de ajuda humanitária, mas também seria um ponto de partida para os esforços políticos necessários para encontrar uma saída para a crise”, disse.
A guerra já teve um enorme impacto humanitário.
Os Estados Unidos estimam que 900 mil civis “provavelmente já se encontram em situação de fome”.
Já o Programa Alimentar Mundial (PAM) das Nações Unidas afirma que 5,2 milhões de pessoas, 91% da população de Tigray, precisam de ajuda alimentar de emergência.
Na sexta-feira, o PAM indicou que havia retomado as operações de ajuda após um hiato de dois dias, mas acrescentou que muitas vidas estavam em perigo depois que as duas principais pontes que conduzem ao Tigray foram destruídas.
“Vidas serão perdidas se as rotas de abastecimento para Tigray não forem totalmente reabertas e as partes no conflito continuarem a interromper ou colocar em risco a livre circulação de mercadorias para o PAM e outros serviços de emergência”.
A ONU afirmou que uma das pontes foi “supostamente” explodida pelas forças de segurança da região de Amhara, ao sul do Tigray, mas o governo regional negou.
Com a eletricidade e as telecomunicações cortadas, os voos suspensos e a maioria das estradas para a região intransitáveis, funcionários da ONU e diplomatas temem que a situação se deteriore ainda mais.
“Um cessar-fogo confiável significa fazer todo o possível para garantir que a ajuda chegue a milhões de crianças, mulheres e homens que precisam dela com urgência”, escreveu o chefe de política externa da UE, Josep Borrell, no Twitter.
AFP